
CAPÍTULO 25
Joe mudou definitivamente para o chalé. Não suportou ficar na mesma casa com o padrasto. Como faltava pouco tempo para completar dezoito anos a mãe não o impediu, principalmente porque o doutor voltou bancando o bom pai. Disponibilizou recursos para que Joe organizasse a mudança, e lhe depositava uma minguada quantia semanal.
Vivendo sozinho retornou às aulas de dança e de canto em Birmingham. Conheceu Ridley, um coreografo jovem e exigente. Trocaram olhares até o rapaz convidá-lo para conhecer onde morava. Depois de dois dias de sexo, dança, música e boa conversa eles se afastaram sem cobranças. Com o tempo fez novos amigos e passou a frequentar pub e boates gays nas cidades vizinhas indo, às vezes, até em Londres. Apreciava locais frequentados por turistas e não se privava quando esbarrava em alguém interessante. Teve vários lances de uma noite. Entre tantos encontros descompromissados e cheios de prazer houve Kyle, Paul, Edmund. Conheceu Marco, um agenciador de garotos que dizia que ele estava dando de graça o que muitos homens maduros pagariam muito bem para ter.
— Odeio velhos! — Disse irritado com a proposta para se prostituir.
Marco aceitou a negativa e por algumas vezes saíram juntos. Joe se embriagava, fumava e usava drogas com frequência. Voltou a se apresentar fazendo pequenos shows solo. E parou de se importar. Mudou a maneira de vestir, tornando-a ainda mais atrevida. Calças coladas, camisetas curtas, transparências, lingeries minúsculas. Usava maquiagem e adornos no dia a dia e não apenas nas apresentações. E nunca se sentiu tão bem consigo mesmo. Sua aparência revelava exatamente o que era:
Um homossexual assumido, livre e sensual.
Às vezes mãe e filho se encontravam pela rua. Celeste, se estivesse sozinha, tentava conversar, perguntando como ele estava, o que estava fazendo. Joe respondia apenas que estava vivendo o que tinha para viver. Mas era raro terem estas breves conversas. Ela quase não saia sozinha. O marido a acompanhava a todos os lugares.
Nick por outro lado o ignorava totalmente. Quanto mais sua homossexualidade ficava evidente, mas o irmão o evitava.
Semanas depois, no dia em que completava dezoito anos, Joe foi convidado para jantar com a mãe. Desceu para a vila a pé. Já cogitava em economizar e comprar uma moto para se locomover. Como o carro do padrasto não estava na garagem tocou a campainha já que a chave que tinha foi confiscada quando saiu de casa. Mordeu o lábio preocupado, torcendo para encontrá-la bem.
Não conversavam com calma desde que Celeste retomou do casamento.
A mãe o recebeu com um sorriso enorme. Joe retribuiu a abraçando forte. Ela parecia saudável e isso foi o bastante para ele não reclamar, outra vez, por ela ter aceito o padrasto de volta. Celeste logo o levou para a cozinha e conversavam enquanto ela terminava de preparar o jantar. Como toda boa mãe salientou a magreza, o ar pálido e cansado dele, o enchendo de perguntas sobre alimentação e hábitos noturnos.
— Tem certeza de que este chalé onde está morando é seguro?
— Tenho mamãe. Não há casas por perto então não temos senhoras xeretando nossa vida e isso é um alívio. — Completou divertido.
— Então se algo te acontecer ninguém vai perceber? — Quis saber alarmada.
— Não se preocupe, não vai me acontecer nada. O que houve no meio do ano foi uma fatalidade! Nosso condado é seguro, a senhora sabe disso.
— Não me sinto tranquila. Tenho insistindo com o seu pai para que volte para casa.
— Mamãe o doutor não é meu pai. — Repetiu com raiva contida como sempre fazia quando a mãe dizia que Neil Spencer era seu pai. — E eu não quero voltar. Estou completando dezoito anos, tenho que tocar a minha vida.
— Ele paga suas contas, se preocupa, age como seu pai! Neil te ama. Ele sempre repete que entende por que você mentiu. Está propenso a te perdoar se você se desculpar!
— Eu me desculpar? Ele é louco! Eu não menti mamãe! Nunca mentiria em algo tão sério! — Afirmou magoado com a acusação injusta.
— Joe...
— Eu não menti! Por que a senhora não acredita em mim? Seu marido é um monstro e a senhora se nega a ver isso.
— Neil não é um monstro Joe! Ele desenvolveu a cura para a pior doença sanguínea que existe! A descoberta dele foi indicada para o prêmio Nobel!! Ele se preocupa com as pessoas, quer ajudar, fazer diferença na medicina. É um cientista respeitado...
— Ego! Ele faz tudo isso apenas para alimentar o ego que tem! E nada do que desenvolveu no trabalho o fez menos monstro comigo. — Sibilou aborrecido.
Fez menção de levantar e ir embora. Celeste o segurou.
— Não Joe! Não! Pare, não vamos falar disso. — Pegou a mão dele e a apertou. — Eu estou feliz por você estar dançando, cantando, fazendo o que gosta. E muito bom te ver bem depois de tudo o que aconteceu. Não vamos brigar, por favor meu amor!
— Está bem mamãe. — Cedeu.
A mãe estava melhor. Mesmo sem gostar era obrigado a admitir que o maldito doutor a deixava ocupada como esposa e mãe que era o papel que estava habituada. A casa estava em ordem, a aparência dela ótima e o aroma delicioso da comida inundava o ambiente.
— Você está com fome. Vamos comer! – Ela disse encerrando o clima ruim e em minutos os dois jantavam.
— E Nick está bem? — Perguntou ainda aborrecido.
— Ele está ótimo! Passa mais tempo em casa agora. Acabou aqueles sumiços, tem boas notas e está cada vez mais amigo Rick.
— É? — Olhou a mãe curioso. — Quem é Rick?
— Ah, irmão de Gillian.
— A filha do Capitão Greene?
— É. Rick tem mais ou menos a idade de Nick e já estudavam juntos, mas não eram próximos. A família mudou para a casa vizinha. Isso os aproximou. Ele está lá agora, foi fazer um trabalho escolar e ficou para jantar. Deve chegar daqui a pouco.
— O Inspetor chefe de polícia é nosso vizinho agora?
— Não. Ele é separado, Gillian vive com a mãe e o padrasto, Ray. Rick é filho do primeiro casamento de Ray, o que o faz meio irmão de Gillian. Mas eles se dão bem! Ele não filho do inspetor de polícia.
— Ah! — Joe disse com certo alívio. — É um bom menino?
— Ótimo. Assim que terminarem o trabalho eles vêm jogar videogame aqui.
— Nick e Rick. Legal. — Riu tentando relaxar com o novo assunto. — Uma nova dupla dinâmica?
— Ah não. São um trio Nick, Rick e Nathaniel, mas não formaram outro trio terror! São ótimos garotos. — Saboreava a refeição, sorrindo e concordando. Celeste hesitou, mas continuou. — Ray comprou o mercado e reabriram. Gillian faz hoje o mesmo que Susan fazia. Estranho não acha?
— Meio mórbido. — Estremeceu.
Não queria pensar em Susan.
— Joe sobre Susan ... seu pai disse...
— Seu marido não é meu pai! Por favor não o chame mais assim. — Rebateu frio. Celeste se calou indecisa e Joe estranhou o silêncio tenso. —No que mais ele disse que estou mentindo?
— Neil... ...disse que está mentindo sobre.... — Celeste hesitava e Joe apenas esperou para ver o que viria. — ...o álibi que deu a Hans no dia que Susan foi morta.
Joe se aprumou na cadeira deixando o garfo de lado. Baixou as mãos para o colo para que a mãe não percebesse o tremor que o dominou. Tomou ar e limpou a boca antes de responder.
— Não “dei” álibi a Hans. Ele estava comigo quando ela foi morta.
— Seu pai... — Parou frente à carranca do filho. — Neil acha que não. Acha que você mentiu quando disse que estavam juntos.
— Ele só sabe dizer que minto. Mãe a senhora está casada com um monstro. Lamento que não acredite em mim e espero sinceramente que não comprove isso da pior forma possível.
Jogou o guardanapo na mesa e levantou para ir embora aborrecido.
— Joe, por favor. — Ele ia para a porta. — Filho, espera! — Ele parou. — Filho se você mentiu... Neil acha que é melhor...
— Eu não quero saber o que seu maldito marido acha! — Sibilou exasperado. — A senhora acredita nele? Que seja, fique com ele e me deixe em paz!
— Joe!!
— A senhora não entende? Seu marido é... Um dia a senhora vai ver o que ele é!
— Filho... Desculpe! — Sem jeito Celeste foi até o aparador da entrada, pegou um envelope e entregou ao filho.
Ainda magoado Joe olhou e viu que, dentro do envelope, havia uma boa quantia.
— Não quero esse presente.
— Não é um presente. São minhas economias. ― Ela murmurou constrangida, os olhos vermelhos. ― Neil acredita que você ficar por sua conta te fara crescer e ser mais responsável, então essa é a última ajuda que terá... de nós! Ele também quer... que você só venha aqui uma vez por mês ou se for convidado... por ele.
Joe gemeu os olhos ardendo pela angústia que ameaçou cegá-lo.
— Ele... ele quer... A senhora vai deixar ele me afastar do bebê?
— Eu também não quero isso! Mas teremos que dar um jeito de melhorar a relação de vocês antes de Naty nascer! Talvez se você se desculpasse...
Joe recuou como se fosse esbofeteado! Apertou os lábios, mordendo-os por dentro até sentir o sangue escorrer.
— Me faça um favor. Enquanto preferir acreditar no doutor, esqueça que sou seu filho. — Disse sem pensar.
Sem mais uma única palavra se virou e saiu da casa.
◆◆◆
Doeu muito ver a mãe preferir o marido mais uma vez. Amassou o envelope com raiva. Pensou em jogar fora, mas o enfiou no bolso envergonhado por precisar do dinheiro.
Aquele estava sendo um aniversário de merda, muito pior do que imaginou que seria. Na noite anterior Darla avisou que iria para a faculdade na Escócia. Havia sido aceita e os pais exigiam que cumprisse o combinado de se formar antes de enveredar na música de forma profissional. Então os planos de retomar a banda foram outra vez cancelados. Agora era proibido de ver a família! Ficaria longe do pedacinho de gente, de Nick, da mãe! É, a vida era mesmo uma merda!
Saia de casa com o coração em frangalhos, olhos embaçados pelas lágrimas contidas. No meio da trilha de pedras que cortava o gramado até a rua quase esbarrou em Nick que chegava com os dois amigos. Nathaniel e Rick lhe acenaram educados e falaram algo com o amigo que deu os ombros olhando para o irmão com raiva.
Zangado com a atitude do garoto, Joe se aproximou.
— Meninos nos deem um minuto por favor! — Sibilou irritado.
Joe pegou Nick pelo casaco, na altura do ombro e o puxou para o lado, se afastando da entrada da casa. O segurou firme mesmo quando o irmão chutou e esperneou com força. Os meninos entraram na casa, dando a eles privacidade.
— Me larga, sua bicha! Eu vou gritar! — Nick disse humilhado.
— Já vi que seu paizinho lhe ensinou como deve me chamar. Para e me escuta porque não importa o quanto chute ou grite eu não vou te largar até me ouvir. — Nick parou zangado por não conseguir se livrar. — Você está virando um rapazinho...
— É. E daí? Vai querer me transformar em um “maricas” também?
— ... foi quando eu estava nessa fase que seu querido paizinho começou a “me dar atenção”.
— Mentira! — Chutou de novo. Foi forte o bastante para Joe sentir a canela arder. — Maldito mentiroso! Me larga!
— Ele já tentou algo com você? — Perguntou frio sem soltá-lo engolindo a dor.
— Não! — Furioso. — E ele nunca fez nada com você! Você é bicha porque gosta.
— Hei, para! Presta atenção! O seu paizinho é um homem horrível! Vi uma bicicleta nova, não é seu aniversário... por que a ganhou?
— Porque não sou um mau filho como você!!
— Que inferno!! Nick escuta bem o que vou te dizer. Seu pai me fez acreditar que eu... para ser um bom filho eu... ele me fez acreditar que o meu corpo era uma moeda de troca! Presentes, dinheiro, ele oferecia o que eu queria em troca de eu deixar que ele... Se ele tentar com você eu quero saber entendeu. — O sacudiu com força. — Entendeu Nick? Se um dia ele for para cima de você não deixe acontecer. Primeiro ele diz que você é especial, que você é um bom filho, que é muito amado. Passa a dar abraços demais, carinho demais... e traz presentes! Muitos presentes. Depois... — O menino parou de espernear e passou a ouvi-lo de olhos arregalados. Joe notou a reação e sentiu o corpo estremecer. — ... ele te olha dormir. Você acorda e ele está te olhando. Faz o mesmo no banho. Se você tranca a porta, ele tira a chave.
— Você é um mentiroso! — O menino sibilou assustado.
— Ele já começou? Em que fase está? Ele te tocou Nick? Pediu para te examinar? Ver se está tudo direitinho? Primeiro o pênis depois seu.......
— Ele é médico! — O irmão gritou.
— Ele é um pedófilo Nick! Quando foi comigo eu não sabia o que era, mas você sabe bem o que isso significa!
— Mentiroso! — Nick o chutou com mais força. Joe o soltou sem perceber. O irmão cuspiu nele. — Tenho nojo de você!
Joe o agarrou de novo, desta vez pelos braços e o sacudiu. O segurou firme, baixando o rosto para encarar o garoto. Nick ameaçou gritar, mas parou com os olhos fixos no irmão.
— Não seja idiota como fui. Não deixe acontecer com você. Se ele tentar qualquer coisa vá me procurar e juntos vamos colocá-lo na cadeia. Entendeu Nick? — O sacudiu outra vez. — Entendeu?
Nick acenou concordando, mesmo sabendo que nunca aconteceria nada. Era tudo invenção do irmão viado, o pai disse. Um viado mentiroso que só queria destruir a família. Joe era um viado, uma bicha, mas ele nunca lhe pareceu tão homem quanto naquele momento.
◆◆◆
O outono terminava e as folhas ressecadas se espalhavam pelo terreno do parque. O vento forte as empurrava de um lado para outro formando ondas amareladas. Era começo da noite de um dia de semana, o local estava vazio. Joe seguia a caminho do chalé cabisbaixo chutando as ondas de folhas. Soluçando parou e se sentou no chão sob a árvore favorita lembrando que foi ali que ficou com Hans como namorado pela primeira vez. Suspirou de dor e saudade.
Olhou ao redor. Não havia ninguém a vista. Tirou um baseado do bolso e acendeu. Tragou procurando o relaxamento que a erva produzia. Fechou os olhos deu outro trago pensando que talvez aquele fosse um dos últimos que iria curtir por algum tempo. Erva era cara e logo não poderia mais gastar dinheiro com isso.
Afinal, completava dezoito anos e estava por sua conta.
Ainda fumando tirou o envelope do bolso e contou o dinheiro. Mil euros. Riu desanimado guardando o montante. Mil euros era tudo o que tinha para tocar a vida. Tocar ou recomeçar? Os olhos se encheram de lágrimas sem querer. Perdeu tudo. Perdeu Hans, perdeu Donovan, perdeu a banda, as amigas, perdeu a família. Estava se afogando em um mar de beijos estranhos e gozos sem prazer, vivendo noites quentes e vazias, para tentar se sentir vivo mesmo sabendo que morreu há seis meses, naquela maldita festa de aniversário.
Hans e Don, Don e Hans. O tempo girou e sentiu, nos lábios os beijos de Donovan, no rosto o vento ao patinar com Hans, se ouviu cantando com Susan, rindo das trapalhadas de Tyler, brincando com Lilian. Até da bruxinha sardenta tinha saudades, percebeu contendo as lágrimas. Estava outra vez sozinha, abandonada por todos, não tinha nada e ninguém se importava com ela. Mas era o que merecia, afinal não passava de uma vadia, vaidosa, egoísta e mentirosa.
◆◆◆
― De pé! ― Alguém mandou lhe chutando tênis. Joe abriu os olhos e se pôs em pé em um salto soltando o baseado no chão. Engoliu seco encarando assustado quem estava a sua frente. ― Ora, ora o que temos aqui? ― Thomas Sinclair disse abaixando e pegando o baseado no chão. Cheirou. Deu um passo acuando-o contra o tronco.
― Oficial... Eu... ― Joe começou a tremer. Já era maior, não podia ser preso. ― ...tenho receita! ― Mentiu.
― Você tem receita? ― Joe acenou que sim. ― Esvazie os bolsos rapaz! ― O policial mandou cético.
Joe abriu a boca e fechou com medo. O policial estendeu a mão com ar carrancudo e arqueou as sobrancelhas esperando. Tremendo Joe esvaziou os bolsos e colocou o conteúdo na mão estendida. O envelope com o dinheiro e outros dois baseados. O homem pegou o envelope.
― O que é isso? ― Perguntou olhando a alta soma.
― Presente de aniversário da minha mãe. ― Rebateu seco.
― Presente de aniversário... — Joe acenou concordando. — Hoje? — Outro aceno. — Quantos anos garoto?
― Dezoito.
― Dezoito? — Riu meio debochado. — Parabéns!
O policial dobrou o dinheiro no envelope e lhe entregou. Sisudo levou os cigarros ao nariz. Aspirou.
― Você tem receita para isso?
― Tenho.
― E onde está?
― Em casa.
― Na sua casa aqui perto ou no chalé onde se esconde?
― Eu... ― Pensou. Estavam perto da casa da mãe, caminho da ronda do policial. Nada o impediria de ir até lá e o mandar pegar a receita. Já o chalé... ― No chalé.
― No chalé. Claro! ― Apertou os lábios. O sorriso ficou mais nítido e malicioso. ― Vamos até seu chalé. Quero ver essa receita. ― Disse e guardou o conteúdo da mão no próprio bolso.
― Eu preciso ir para a casa da minha mãe... ela está me esperando...
― Então talvez eu deva te levar para a delegacia e deixar você se explicar com o Inspetor chefe, em vez de resolvermos isso entre nós. Prefere assim?
― Não. Tudo bem. Vamos até o chalé! ― Joe disse assustado. Se moveu e precisou para passar rente ao policial que não lhe deu espaço. ― É por aqui. ― Disse indo em direção a estrada.
― Sei onde fica. Vamos pelo bosque!
― Não.... eu...
― Pelo bosque Spencer. Tenho pressa. ― Mandou tomando o caminho sem olhar se era obedecido.
Saíram do parque, entraram no caminho do bosque pela estrada, depois viraram na trilha. Na mata o policial o deixou passar e seguiram em silêncio por vários minutos. Joe o seguia tremendo, tentando lembrar se ainda tinha a receita que o doutor lhe deu há anos para se livrar rápido de situações como aquela. Mesmo que a tivesse, com certeza não justificaria o uso. Parou. Se virou disposto a admitir que mentiu, mas antes que pudesse dizer algo foi empurrado contra uma árvore. Abriu a boca para gritar e seu grito foi engolido por lábios duros que o beijaram com sofreguidão. Não pensou em resistir, então manteve as mãos sobre os ombros do homem que era pouco mais alto do que ele. O beijo foi intenso e o policial gemeu quando se afastou por um segundo.
― Tem mesmo dezoito garoto? ― Joe concordou chocado. E foi beijado mais uma vez, só que desta com suavidade enquanto o corpo era ajustado ao outro por mãos firmes e hábeis. ― Porra! Você é demais! ― Sinclair sussurrava entre um beijo e outro enquanto se esfregava nele excitado. Joe tremia muito assustado para corresponder. O policial se afastou quando percebeu o medo dele. ― Relaxa, não vou fazer nada que não queira. ― Joe não respondeu. Sinclair suspirou e o soltou. Sentou-se aos pés de outra árvore exatamente como Joe estava antes. Tirou o aboofan, largando-o de lado, e ajeitou os cabelos com a mão. Tateou o bolso do uniforme, pegou o baseado, colocou na boca e acendeu. ― Senta. ― Mandou quase rindo da expressão surpresa do rapaz. Tragou. ― Desculpe por tê-lo beijado sem permissão. Minha melhor justificativa é que queria fazer isso há meses.
Tirou do bolso o que pegou e estendeu para o garoto que continuava de pé.
― Você queria me beijar há meses? ― Joe perguntou receoso.
Estavam sozinhos na mata. Pegou os pertences e colocou no bolso com mais medo do que antes.
― É. Eu li suas conversas e você... uau você parece saber fazer coisas que... ― Deu outra tragada no cigarro. ― Mas não se preocupe, não pretendo forçar nada. ― Tragou fundo. ― Mercadoria muito boa essa. Onde compra?
― Vai me prender? Se não for, vá para o inferno!!
― Eu te assustei não foi? ― Sinclair disse levantando e terminado o baseado. ― Sinto muito, não foi minha intenção. Não sou bom em joguinhos de sedução.
― É o que queria? Me seduzir? ― Joe disse cruzando os braços e arqueando um pouco o corpo.
O pedido de desculpas foi inesperado. Aquele encontro tomava um rumo inesperado.
― Mais ou menos. ― Sinclair se arqueou e passou a mão no rosto olhando-o cobiçoso. ― Na verdade, quero foder você, mas sem essa de romance, de envolvimento. Fico de pau duro sempre que te vejo e você nunca me nota. Só quis demonstrar meu interesse. Fui idiota. Desculpe.
― Sempre que me vê fica... ― Joe olhou para o baixo frente dele e sem querer sorriu notando o volume vantajoso. ― ... como está agora?
― Sempre. Você anda por aí todo estiloso. Se mexe de um jeito que coloca qualquer pau de pé. Desejo te foder de todas as formas possíveis!
― Vai me prender? ― Joe perguntou apontando o baseado.
― Por isso? ― Sinclair riu dando os ombros. ― Claro que não. Isso é besteira.
― Sério?
― Sério.
― Vou ficar lhe devendo?
― Não. Não troco favores, não quero nada por obrigação, só tenho vontade de foder sua boca desde que te vi cantar. ― Notou que o rapaz se aproximava devagar. Sorriu. ― Felizmente não preciso pôr no relatório de ronda onde passo meu intervalo.
― E quando começou seu intervalo?
― Dois minutos antes de eu te abordar no parque.
― E quando termina?
― Em cinco minutos. ― Disse quando o garoto parou a frente dele e molhou os lábios.
— Cinco Minutos? Aqui? — Joe olhou ao redor.
Anoitecia, mesmo assim havia o risco de seres vistos.
— Gosto do risco. — Irônico. Tocou os lábios dele com os dedos e Joe lambeu de leve o indicador. O policial gemeu. Atrevido Joe riu, abocanhou e chupou o dedo médio devagar. — Puta que pariu garoto!
Joe fez uma careta vitoriosa. Sem pensar muito ajoelhou-se. As mãos não tremiam quando abriu as calças do policial e o explorou como sabia fazer, satisfeito em vê-lo gemer e se contorcer até gozar estremecendo em um longo espasmo.
Mal levantou e Sinclair se recompôs. Limpou a boca.
— Posso ir agora? — Perguntou ainda temendo ser preso.
— Ir? Por quê? Eu não retribuí.
Sem que Joe esperasse Sinclair ajoelhou na frente dele. Ofegou sentindo primeiro as mãos frias, depois os lábios quentes. Gemeu, ofegou, se rendeu enfiando os dedos na farta cabeleira castanha do policial. Em poucos minutos gozou. Sentiu as pernas bambas ao vê-lo engolir tudo sem hesitar. Mantendo-o seguro pelos quadris o policial levantou e o beijou dividindo o sabor que tinha na boca.
— Delicioso! — Sinclair sussurrou.
Riu do espanto do garoto como se não tivesse feito nada demais. De forma lenta e sensual o prensou contra a árvore e trocaram longos beijos por vários minutos.
— Vamos para o chalé. — Joe sugeriu excitado.
O policial sabia muito bem o que fazer, isso ficou claro.
— Estou em serviço. Fica para outro dia.
— Quer dividir o último baseado? — Perguntou quando foi solto.
― Não. Preciso voltar para a ronda
Joe riu baixo sem acreditar. Vasculhou os bolsos encontrou o cigarro acendeu e saiu fumando tranquilamente.
— Se cuida garoto. A gente se esbarra. — Ainda ouviu Sinclair gritar antes de se distanciar.
◆◆◆
E era fácil eles se esbarrarem pela cidade. Em uma das vezes, nos fundos do Toby’s, Sinclair o puxou para o corredor externo. Quando o policial disse o que queria Joe recuou sem entender.
— Nunca fiz isso! — Murmurou surpreso.
Então Sinclair o virou e o explorou com os dedos e com os lábios em uma caricia alucinante. Joe se rendeu rápido, pois nunca foi tocado daquela forma.
— Agora que aprendeu, faça em mim. — Mandou e Joe o atendeu excitado.
Em outra se encontraram-se no mirante. Desta vez foi Joe que se aproximou e acendeu o baseado na frente dele. Sinclair fumou com ele e sem falarem repetiram o que fizeram juntos nos dois últimos encontros.
— Vamos lá para casa. — Joe pediu entre um gemido e outro.
Sinclair apenas riu e o deixou.
— Não. Está interessante assim. Em breve te faço uma visita.
◆◆◆
Semanas depois passava de uma da manhã e Joe estava sentado na varanda, enrolado em um cobertor, remoendo a frustração de não conseguir manter a mãe longe do doutor. Tirou um cigarro do bolso e acendeu sem pensar muito. Fumava regularmente desde que se viu sozinho. Algo se moveu nas sombras e ele levantou a cabeça atento. Olhou ao redor. Não viu nada na escuridão. Ajeitou-se na cadeira de balanço quando o farol de um carro o iluminou. Sorriu ao ver quem chegava.
A viatura parou devagar. Sinclair desceu olhando bem para cada lado antes de se aproximar. Joe não se moveu mesmo quando o policial parou a poucos centímetros dele.
— Insônia? — Sinclair perguntou à guisa de cumprimento
— É. — Joe puxou um trago fundo do cigarro.
— Está frio. Não é uma noite agradável para ficar ao ar livre.
— Verdade. — Soltou a fumaça a poucos centímetros do rosto do policial.
— Isso é ilegal.
— Eu sei.
— Eu deveria prendê-lo. — Como resposta Joe repetiu o gesto. Sinclair sorriu malicioso. — Se você for bem persuasivo posso aliviar sua barra...
— O que tenho que fazer? — Levantou as sobrancelhas de forma irônica.
— O que está disposto?
— O que você quiser.
— Então faça. — Sinclair disse abrindo a calça. O membro ereto saltou.
— Aqui fora? Vamos entrar... — Joe convidou sugestivo.
— Aqui está bom. — Olhou ao redor. A escuridão do bosque era total. — Sabe que gosto do risco. — Molhou os lábios sedutor. — Tenho cinco minutos de intervalo.
— Por que está sempre com pressa? — Joe disse e sem hesitar ajoelhou-se na frente dele.
No tempo contando Sinclair se rendia aos lábios quentes. Joe se levantou, cuspiu longe a seiva do policial fazendo-o rir. Thomas Sinclair lambeu a boca dele, sugou os lábios, depois limpou os cantos em um gesto malicioso. O beijou de novo.
— Você tem um talento único neste quesito rapaz! — Elogiou.
— Que tal voltar quando seu turno terminar e me deixar demostrar meus outros talentos?
— Vai ter que cometer um crime maior do que fumar um baseado para me ter na sua cama.
— Já cometi crimes maiores. — Disse soltando o lençol que o envolvia.
Estava nu e pronto.
— Puta que pariu, garoto!
Daquele dia em diante, tornou-se comum o policial, após a ronda noturna, aparecer no chalé e sair ao amanhecer.
Na madrugada do domingo de Páscoa, depois de passar dois dias em uma rave regada à bebida, drogas e pegação, Joe tomou dois comprimidos querendo dormir por no mínimo doze horas. Estava terminando de ajeitar o travesseiro quando a campainha foi tocada de forma desesperada. Levantou saltitante, pois só podia ser Sinclair para mais brincadeiras excitantes. Abriu a porta com um sorriso largo que morreu rápido. O coração rachou transbordando raiva, ódio e dor.