
Capítulo 26
Santa Fé – EUA
Março
Cruzar novamente os portões da prisão teve o mesmo significado de ter sido condenado. Os prisioneiros o olharam com o respeito devido a um assassino notório. Até os mais violentos se afastaram quando passou. Desta vez foi colocado em uma cela sozinho de onde saia pouco. Foi no terceiro dia que Andrew se sentou em sua frente no horário do almoço. Ainda usava o disfarce de Andréia.
─ Não esperava te ver aqui. Sei que não foi condenado. O que aconteceu?
─ O julgamento foi suspenso até 04 maio.
─ Mais de um mês. Isso não é comum. Por que foi suspenso?
─ Minha mãe apareceu e testemunhou que eu tenho um gêmeo. O juiz decidiu suspender tudo até que seja comprovada a existência desse irmão. ─ Calmo Leigh contou tudo o que havia acontecido. Andrew fez alguns comentários e perguntas as vezes esquecendo-se de afinar a voz. Leigh riu.
─ Qual a graça? ─ Perguntou intrigado.
─ Você com essa voz grossa de maquiagem e essas roupas. É casado?
─ Já fui. Tive marido e três filhos. ─ Arqueou a sobrancelha frente ao ar surpreso do amigo. Leigh deu os ombros. ─ Não deu muito certo por conta da minha profissão, mas mantenho contato com meus filhos. Entendo sua necessidade de estar com a família. Fazer maquiagem todo dia é muito cansativo. Quando este caso terminar vou repensar minha carreira. ─ Leigh riu alto e Andrew sorriu sedutor. ─ Todos vão achar que você está encantado por mim.
─ Que seja. ─ Olhou ao redor ─ Não sei como consegue ficar aqui.
─ Estou trabalhando.
─ E tem tido sucesso?
─ Algum. Descobri o que vim descobrir agora só falta fechar o cerco.
─ Pode me dizer no que está trabalhando?
─ Tráfico humano. Coisa grande. As ordens e as escolhas das vítimas saem daqui. Precisava descobrir os mandantes e seus intermediários. Há policiais envolvidos, então tudo se complica. Há poucas pessoas em que posso confiar. Passei a informação de um carregamento e de pontos de confinamento de mulheres e crianças. Alguns peixes pequenos foram presos. Devo ficar aqui por mais alguns dias. E só acontecer a movimentação que estamos aguardando com a presença de gente graúda. Daí trabalho encerrado e eu curto seis meses de férias.
─ Merecidas! ─ Leigh disse e Andrew concordou.
─ Quer ajuda para tentar localizar esse seu irmão? Tenho alguns bons contatos na Interpol. Podem ajudar.
◆◆◆
Foi no dia seguinte a conversa que uma nova leva de prisioneiros chegou. Alguns eram recém-condenados e outros transferidos. Ao todo foram oito novatos. Dois, os presos pegaram na mesma noite. Da cela onde estava Leigh pode ouvir os gritos dos rapazes. Questionou o guarda porque não impediam aquilo e ele riu debochado. Falou com Andrew e este o aconselhou a não se envolver. Explicou que os estupros eram comuns nas prisões e que pouco podia ser feito.
─ Temos tentado resolver esse tipo de coisa, mas não é simples.
─ Castrem quem fizer isso, que duvido que o hábito persista. ─ Leigh murmurou irritado sem perceber como a sugestão intrigou o amigo policial.
Caminhavam para o pátio na hora que o grupo cercava outros dois novatos. Um logo foi arrastado para a lavanderia. O outro reagiu com alguns golpes e conseguiu se livrar dos que o seguravam. Um dos líderes, contrariado, fitou o rapaz louro com deboche. Puxou um pequeno estilete da manga e estava a ponto de acertá-lo quando um guarda interferiu.
O homem guardou a arma contrariado.
─ Não se preocupe. Agora você vai ter que vencer o Golias. ─ Mostrou o gigante um pouco atrás. ─ E depois que ele te amansar eu vou ser o primeiro a gozar nessa sua boquinha bem-feita. ─ Passou por ele indo se sentar no banco lateral.
O rapaz ficou parado. Armou um golpe quando o gigante se aproximou, mas este apenas passou por ele e foi se sentar ao lado do chefe.
─ Não se envolva. ─ Andrew disse para Leigh ao vê-lo de punho cerrado e olhos fixos no rapaz assustado. ─ Você pode ter vencido o brutamonte duas vezes, mas se se envolver vai quebrar as regras e todos eles se juntam e te pegam. E nem você pode com todos ao mesmo tempo.
─ Faça algo. Ele é inocente. ─ Leigh murmurou fitando o rapaz louro.
Havia algo no rapaz que Leigh via, mas não conseguia acreditar. Algo que sabia que era impossível. Não ali. Não em tão pouco tempo. Não naquele local.
─ É inocente e bonito. Infelizmente não estou aqui por ele. Não é assim que funciona Lescaut lamento. E siga meu conselho. Não se envolva. ─ Aproximou-se do rapaz e sorriu de forma sedutora. ─ Se eu não tivesse meu homem lá fora até que te mostrava o que é diversão garoto. Vença o Golias que eles te deixam em paz.
◆◆◆
Michael passou dias pesquisando até conseguir descobrir os principais sócios da firma de advocacia que Eva informou como sendo a que representava o Chanceler na Europa. Falou com um antigo professor especialista em direito internacional e soube que eram renomados advogados ingleses conhecidos por zelarem pelo anonimato de seus clientes. Representavam sheiks, governantes de pequenos países, executivos de grandes grupos e milionários excêntricos. Não tinha esperança de conseguir qualquer informação, mas precisava ao menos tentar. Atento ao fuso horário telefonou durante a madrugada quando lá era meio da manhã. Ao mencionar o nome do Chanceler Vladimyr Meneslaups a ligação foi transferida imediatamente para outra área.
─ Diretoria. ─ Uma voz quase metálica atendeu.
─ Estou tentando contato com o Chanceler Vladymyr Meneslaups.
─ Quem deseja falar com ele?
─ Michael Melton. Represento Hansalexius Anton Leigh Conanlescaut Borlowish Spartwalyskis Borwoshi Meneslaups.
─ Um momento, por favor. ─ Michael aguardou.
Quase dois minutos depois uma voz firme atendeu.
─ Carter. ─ Um sócio majoritário. Sem dúvida ninguém mais daria informações sobre Vladymyr Meneslaups a não ser um dos sócios principais.
─ Boa tarde Senhor Carter. Sou Michel Melton, colega de profissão. Quero entrar em contato com o Chanceler Vladymyr Meneslaups. Represento o senhor Hansalexius Anton Leigh Conanlescaut Borlowish Spartwalyskis Borwoshi Meneslaups no caso de ... ─ Um chiado na linha entrou na ligação.
─ Qual o assunto?
─ Seria algo a tratar apenas com o Chanceler.
─ O senhor representa o herdeiro do espolio de Hansalexius então são assuntos jurídicos e nos assuntos jurídicos nós representamos o representamos. Pode falar do que se trata.
─ Trata-se de questões relacionadas a família.
─ Não há família neste caso. O que aconteceu com o Senhor Lester? ─ O tom era irônico. ─ Foi despedido por total inabilidade em processos de espolio?
─ Meu cliente nunca foi representado por nenhum Senhor Lester. Tampouco represento o herdeiro de um espólio. Represento o próprio Hansalexius. Deve estar ocorrendo algum tipo de engano, senhor Carter.
Houve uma pausa na conversa. Quando voltou a falar o tom do advogado era sério e preocupado.
─ Como disse que é mesmo seu nome?
─ Michael Melton, da firma Reynolds Associados São Francisco Califórnia.
─ Americano?
─ Sim.
─ O senhor representa Alexius Leigh Lescaut?
─ Sim. ─ Outro longo silencio.
─ Ele foi banido e deve aguardar outro ciclo para que possa ser reconhecido como Koryak novamente. Nenhum processo jurídico vai devolver a ele os diretos retirados.
─ Não estamos tentando recuperar nenhum direito perdido e sim descobrir onde está o gêmeo de Alexius. ─ Michael parou pensou um pouco. A pergunta veio sem querer ─ Quem é o herdeiro de Hansalexius?
─ Não tenho como ajudá-lo, Senhor Melton. O Chanceler deixou ordens claras que não se envolveria mais de nenhum assunto ligado aos Hansalexius. Ele foi um pai dedicado e compreensivo que sofreu o desgosto e a desonra pelo comportamento abominável dos filhos. E por respeito aos costumes do povo os mortos devem ser deixados em paz. Basta de vergonha na família real de Koryakia.
Antes que Michael pudesse retrucar a ligação foi cortada. Michael pousou o telefone devagar sobre o gancho. A última frase ressoava em sua mente. O pequeno plural antes do nome Hansalexius parecia latejar em sua cabeça. Algo estava ali, mas não conseguia entender o que era. Voltou a se deitar pensando. Sem razão aparente a conversa que teve com Eva Rollins logo depois que ela testemunhou lhe voltou como se a estivesse revivendo.
◆◆◆
─ Venha Senhora Carson. Temos que descobrir onde pode estar o gêmeo de seu filho. ─ Michael a levou até um restaurante. Já era noite e ele pediu o jantar. ─ A Senhora disse que Vladymyr Meneslaups tinha um filho mais velho do que Leigh com a primeira esposa. Essa mulher... não era a tal Mary Elisabeth? A mulher que levou o menino? Ela não foi casada com o Chanceler? ─ Michael questionou.
─ Não conheci a primeira esposa do Chanceler. Ela vivia reclusa. Conheci a segunda, Aylena, mãe do primeiro filho, que era dois, três anos mais velho do que os gêmeos. Eu os via com frequência nas primeiras festas que participei. Não se trata do gêmeo de Alex. Mary Elisabeth deve ter sido a quarta esposa, mas passou pouco tempo casada. Reno logo a seduziu e fugiram juntos.
─ E se o pai os encontrou como fez com Leigh? É possível que hoje vivam lá?
─ Isso jamais aconteceria. Quando uma mulher foge com outro ela é considerada traidora do reino. Jamais seria aceita novamente. Se o Chanceler os alcançou ela e Reno foram executados.
─ E o que aconteceria com o menino?
─ Eu ainda estava lá quando o conselho declarou que os gêmeos nascidos em 13 de outubro não trariam o arrais por serem frutos mesclados. ─ Viu que ele não entendeu. ─ Filhos de estrangeiros e não de Koryaks puros. Com esta declaração Vladimyr relaxou nas buscas aos traidores. Se foram encontrados depois que fugi não sei que destino ele daria ao menino. Talvez algo parecido com o que fez com Alex.
─ Mosteiro ou escola militar. Essas foram às opções dadas ao seu filho. ─ Pensou ─ Não acha que o irmão que Leigh menciona possa ser o gêmeo?
─ Vladimyr não falava sobre a família. E eu não me interessava em perguntar. Tinha muita vergonha de minha condição, mas pelo que sei ele tinha duas esposas e outros dois filhos já no tempo em que eu era casada com Reno. ─ Pensou um pouco ─ O que sei é que o gêmeo de Alex desapareceu no mundo com Reno e Mary Elisabeth. Vladymyr não os encontrou enquanto morei lá. Uma vez mencionei Reno e Vladymyr blasfemou furioso e trancou-me no porão por dois dias. Quando me libertou disse que: O maldito traidor um dia seria pego e condenado a morte eterna. Isso foi poucos dias antes de Reno aparecer e nos tirar de Koryakia.
─ E o primogênito do Chanceler? O que sabe dele?
─ Sei que era bem mais velho do que Alex. Lembro que, quando o menino foi estudar fora Alex já tinha quase oito anos. E em Koryakia só se vai estudar longe do país aos 14 anos. E só o que sei. ─ Parou pensativa. ─ Lembro-me de tê-lo visto de longe em uma cerimônia. O filho mais velho de Vladymyr era um rapaz loiro. Não Senhor Melton o outro filho de Vladymyr não era o gêmeo de Alex.
─ Então, a única pessoa que pode nos dar alguma notícia sobre o gêmeo é seu ex–marido. ─ Michael frustrado. ─ Alguma ideia de onde ele possa estar?
─ Não. Ele nunca nos procurou. Renegou Alex completamente. Para eles era como se Alex não existisse.
─ Dê-me o nome dele, por favor.
─ Nicolai Reno Conanlescaut Borlowish Meneslaups Spartwalyskis Borwoshi II.
─ Segundo? Interessante. O que sabe da família dele? Alguém fora do país a quem pudesse recorrer? Algo sobre os pais? Eram chegados não? Afinal tem o nome do pai.
─ Não. Reno nunca mencionou os pais. E em Koryakia os gêmeos recebem o mesmo nome. Primeiro e segundo conforme a ordem de nascimento. Era normal isso acontecer. Por exemplo, meu cunhado era Nicolai Reno Conanlescaut Borlowish Meneslaups Spartwalyskis Borwoshi I e meu marido era o II. O mais velho era chamado de Nicolai e o mais novo de Reno. Não sei como isso não gerava confusão no sistema de identificação. ─ Tentou brincar.
Michael levantou em um ímpeto. Não conseguia dormir. Foi para a cozinha e preparou um chá. Colocou uma dose de conhaque na bebida e tomou devagar. Queria entender o que sua mente estava tentando lhe mostrar. Voltou para a mesa de trabalho e sem saber o que procurava buscou sobre a mesa algumas anotações. Releu alguns depoimentos até que passou os olhos no do professor Franz Bell. Retirou uma caneta marca texto e sublinhou alguns pontos. E quanto mais lia mais se animava.
◆◆◆
Bradley Weston iria cumprir cinco anos depois de se declarar culpado, conforme orientado por um incompetente defensor público designado para defende-lo e que não quis ouvir as testemunhas que comprovavam que agiu em defesa de uma jovem assediada. Foi condenado a cinco anos. Outro advogado estava recorrendo e havia a chance de sair em dois anos por bom comportamento, mas como ter bom comportamento naquele covil de lobos? Ainda mais com a ameaça constante de virar mocinha de alguém. Não aceitava isso. Já tinha se vendido até por uma dose ou transado com caras por vontade própria, mas nunca foi mocinha de ninguém.
Até que parou com o pó, com os picos e nunca mais se vendeu. Não gostava. Por isso partiu para furtos de carros quando precisava levantar alguma grana. Era rápido e sempre tinha comprador. Até aquela merda! Não ia ser mulherzinha de ninguém. Arrumou o macacão e se afastou sem prestar atenção no que uma bicha sussurrou em seu ouvido. Reconheceu o tal assassino das bonecas. Merda! O sujeito não tirava os olhos dele. Outro pervertido. Aquele lugar era o inferno.
◆◆◆
Um a um os novatos foram levados a “colaborar”. Os gritos eram ouvidos sem ninguém intervir. Leigh observou a campanha de terror feita para o rapaz louro. Passavam por ele e o alisavam. O agarravam no corredor e forçavam beijos. Durante uma sessão de filme o chefe fez com que o segurassem e lhe tirou as roupas exibindo-o nu como um troféu. Fez gracejos sobre o membro e o tom de pele dourado, apesar das madeixas louras. O largaram após outra intervenção dos guardas. O boato é que planejavam uma festa coletiva. E a festa era aberta a quem quisesse participar.
O rapaz demonstrava medo e pediu transferência para outra prisão.
Leigh duvidava que o pedido fosse aceito e a transferência realizada antes que o pior acontecesse. Via o garoto se preparar para lutar sempre que o grupo se aproximava. O observava correr pelo pátio se exercitando mesmo em uma tarde de chuva, treinando o pouco que sabia determinado a resistir o máximo que pudesse.
Algo nos movimentos chamava sua atenção e ele não conseguia desviar o olhar. Andrew o alertou outra vez para não se envolver, mas imaginar o rapaz massacrado e humilhado era algo que incomodava.
─ Você está flexionado errado. Pode aumentar a força do impacto se manter o joelho mais baixo. ─ Disse se aproximando.
O rapaz treinava golpes com o dorso do pé.
─ Como? Assim? ─ Perguntou assumindo outra posição.
─ Não. Mais baixo. ─ Bradley corrigiu a postura e Leigh acenou concordando. Os presos os observavam. Leigh se afastou e foi sentar em um dos bancos. Não demorou e o rapaz louro sentou ao seu lado. Estava nervoso.
─ Sou Bradley Weston. ─ Leigh não respondeu. O rapaz prosseguiu forçando um tom descontraído. ─ Ouvi dizer que você luta bem. ─ Silêncio. ─ E pela dica que me deu entende mesmo do assunto. Pode me ensinar?
─ Você sabe o bastante.
─ Sei? ─ Bradley riu descrente.
─ Sim. Só não se lembra como usar.
─ Sei o bastante para vencer quinze homens? ─ Ironizou.
─ Tem que vencer o Golias. Fazendo isso eles te deixam em paz.
─ Foi o que você fez? Você o venceu?
─ Duas vezes. ─ Leigh levantou correndo os olhos pelo pátio. De todos os pontos eram atentamente observados e aquilo não era bom para nenhum dos dois
─ Espera, por favor. ─ O rapaz olhou o grupo. Estava realmente assustado. ─ Me ajude.
─ Não posso me envolver. ─ Olhou o grupo também. ─ Se me envolver posso ter que matar alguns e não posso fazer isso agora. Tenho que sair daqui limpo.
─ Por favor. ─ Havia pânico na tom. ─ Eles querem... ─ Aspirou tenso. ─ Cara! Quinze! Eles são quinze. Eu não consigo vencer quinze! ─ Saiu do banco e se aproximou ─ Por favor... ...você tem o respeito deles. Me disseram que é um cara legal... apesar de... Eu vi como você... ...me olha. Eu faço o que você quiser... ─ O encarou tenso. ─ Entende? Me livre dessa e eu faço o que você quiser.
Leigh apertou os olhos.
─ Você está... ...se oferecendo a mim? ─ Leigh sibilou franzindo o cenho. O rapaz tomou ar.
─ Já fiz programas. Meus clientes disseram que chupo gostoso. Se me proteger posso te dar bons momentos. Te fazer gozar do jeito que quiser. ─ Deu mais um passo na direção de Leigh. ─ Se me proteger e for gentil você pode ate me fo...
Antes que a frase fosse terminada Leigh o acertou com as costas da não direita em uma bofetada violenta. O rapaz caiu engasgando com o impacto. O canto dos lábios começou a sangrar. Leigh se abaixou ao lado dele.
─ Por um minuto pensei que desejava preservar a honra e não a pele. Merece o destino que tem pela frente. ─ Sem ser incomodado se afastou.
◆◆◆
─ O que foi aquilo? ─ Andrew perguntou chegando depois de uma pequena corrida até o amigo. ─ O que o rapaz lhe disse que te deixou tão irritado?
─ Disse que... ─ Parou olhando o rapaz tentando se levantar ainda tonto ─ O desgraçado se ofereceu a mim. Pediu ajuda e disse que... faria o que eu quisesse.
─ E isso o ofendeu. ─ Andrew o observava.
─ Achei que quisesse salvar a honra e não a pele. Dane-se. Merece o destino que tem. ─ Voltou a andar.
Andrew correu para acompanhar as passadas largas.
─ Lescaut o que ele tem aqui para negociar além do corpo bonito? ─ Leigh parou.
A expressão era uma máscara de raiva.
─ Você não entende.
─ Não, você não entende. Você disse que ele merece o destino que tem. Eu acho que não. Bradley Weston tem vinte e três anos. Há seis foi encontrado em uma lixeira mais morto do que vivo. Estava tão surrado e violentado que até hoje não se sabe como sobreviveu. Nunca disse quem era ou quem tentou mata-lo. Nunca foi realmente identificado. O nome que tem lhe foi dado no abrigo para onde foi levado e de onde fugiu na primeira oportunidade. Depois disso viveu nas ruas. Do passado ninguém sabe nada. Até os dezoito anos batia carteiras e praticava pequenos furtos para sobreviver. As vezes se vendia. Não é bonito, mas era necessário porque ficou viciado quando saiu do hospital de tanto remedio que tomou para alivar as dores dos ferimentos sofridos na surra. Precisava se manter. Nunca foi violento. Por sua habilidade em lutas duas vezes ajudou mulheres que estavam prestes a serem estupradas. Duas vezes comprou briga que não era dele para não ver alguém passar pelo que sabe que vai passar agora. Isso consta na ficha dele. Largou o vício há dois anos, entrou na faculdade e tentava se ajeitar quando deixou um playboy de fraternidade mixando sangue depois de assediar uma garota. O problema era que o tal playboy era filho unico de um juiz babaca. Por isso pegou cinco anos aqui, no meio da escoria. Ele não deveria estar aqui. Não é um mau rapaz. É só alguém que não tem sorte na vida. Falta de sorte não é falta de honra. ─ Olhou o rapaz caminhando para o banheiro ─ E não tem sorte mesmo. ─ Um grupo de presos o seguia. ─ Acho que é hora da festa.
◆◆◆
─ Holly chame Liam e me encontrem na sala de reunião. ─ Michael pediu passando pelo corredor.
Quando os dois chegaram o encontraram mergulhado em papéis. Antes que se acomodassem Michael deu uma folha para cada.
─ O que você está fazendo? ─ Liam perguntou curioso.
Michael levantou e foi para o quadro branco onde estava anotado as principais informações sobre o caso. O nome completo do cliente estava escrito duas vezes em letras garrafais.
─ Liam, leia para mim a linha marcada. ─ Pediu sem responder. Liam obedeceu.
─ Perdeu os direitos quando se casou sem autorização do atual Chanceler, que assumiu sua guarda assim que nasceu. ─ Michael fez um gesto para que prosseguisse em outra parte também marcada. ─ Teve que renunciar até seu nome...
─ Sua vez Holly. Leia a parte marcada.─ Michael o interrompeu.
─ Um gêmeo é geralmente cedido a uma das esposas do pai e é criado longe do irmão muitas vezes sem sequer saber que ele existe. Devem se encontrar apenas aos 45 anos para que se completem. Mas não sei se isso ocorreria na casa Real. A identificação precisa do Chefe de Guarda seria prejudicada. Seria impossível definir qual é o príncipe Hansalexius Anton Leigh Conanlescaut Borlowish Spartwalyskis Borwoshi Meneslaups. ─ Michael a cortou agitado.
─ Leia a última frase Liam.
─ Tornou-se apenas Alexius Leigh Lescaut, que é parte de seu nome de direito. ─ Os dois se olharam sem entender onde Michael queria chegar.
─ Eva Carson me contou que os gêmeos recebem o mesmo nome. Acrescentando ao nome primeiro e segundo conforme a ordem de nascimento. ─ Michael desenhou o I logo após o nome do cliente. ─ E o que nasce depois é o segundo. ─ Desenhou o II na segunda grafia. ─ Mas que no dia a dia são usados, para o mais velho o primeiro nome. ─ Devagar escreveu Anton logo abaixo ─ E para o mais novo o segundo nome ─ Escreveu Leigh.
─ E? ─ Holly olhava as anotações. ─ Acha que o gêmeo se chama Anton?
─ Não. Leigh se chama Alexius Leigh Lescaut que é... ─ Fez um sinal para Liam.
─ Parte de seu nome de direito.
─ E o nome de direito dele é Hansalexius Anton Leigh Conanlescaut Borlowish Spartwalyskis Borwoshi Meneslaups. Se Leigh é o segundo e tem a segunda parte do nome, podemos deduzir que o primeiro ficou com a primeira parte, assim temos... ─ Michael colocou uma barra em cada uma das grafias do nome do cliente e escreveu o que encontrou.
─ Hans Anton Conan. ─ Holly leu admirada pela conclusão do chefe.